Relato de experiência: Ayahuasca (a bebida sagrada)
Fonte: pixabay |
Ayahuasca[1] (do quíchua aya, que significa 'morto, defunto, espírito', e waska, 'cipó', podendo ser traduzido como "cipó do morto" ou "cipó do espírito"[2]), também conhecida como hoasca, daime, iagê,[3] santo-daime e vegetal,[4] é uma bebida enteógena produzida a partir da combinação da videira Banisteriopsis caapi com várias plantas, em particular a Psychotria viridis e a Diplopterys cabrerana. (Wikipédia)
Ayahuasca é um chá, com potencial alucinogênio, feito a partir de uma mistura de ervas amazônicas, que é capaz de provocar alterações da consciência por cerca de 10 horas, sendo, por isso, muito utilizada em vários tipos de rituais religiosos índios para abrir a mente e criar visões místicas. (Tua Saúde)
Há algum tempo eu andava pesquisando
para realizar essa experiência. Nunca encontrava nenhum local próximo, o que inviabilizava
a possibilidade, mas o desejo ficou em aberto e estava em casa quando recebo a
mensagem da minha irmã dizendo que iria participar de um encontro onde haveria
um ritual com a bebida sagrada.
Ela não sabia que eu tinha
vontade de experimentar. Até onde ela sabe eu pratico meditação (não tão disciplinadamente)
e por isso ela resolveu compartilhar a informação.
A princípio fiquei apreensiva,
era chegado o momento, mas, eu deveria ir mesmo? Fiz a inscrição na véspera e
pensando que não era obrigada a ir e poderia desistir a qualquer instante se
assim o desejasse.
Fiquei até o ultimo momento
pensando “vou ou não vou?” Li muitos relatos a respeito dos benefícios e dos
efeitos colaterais e digamos que o chamado foi mais forte e resolvi ir.
Detalhe, o local da prática estava
a menos de 15 minutos de casa. E olha que já havia procurado por diversos
lugares pelo Brasil e a distância era um ponto “dificultador”.
Fui.
Foram uns 10 km de asfalto e uns
4 km de estrada de terra que me levaram a uma chácara que pertence a um bairro da
cidade em que moro atualmente.
Segui as recomendações durante a semana,
que era a de não comer carne nem ingerir bebida alcóolica. Isso foi muito
tranquilo para mim.
Vesti uma calça e blusa soltinha,
levei um colchonete, um edredom (que foi solicitado e eu pensava que não teria
utilidade em pleno setembro acalorado).
Ao chegar no local já vi alguns
gatinhos e como amo gatos já me senti ambientada.
As mulheres vestiam saia ou
vestido longo com legging por baixo, os homens de calça, enfim as roupas eram confortáveis
e já me fizeram entender que eu não estava em um ambiente comum. Algo diferente
aconteceria ali.
Pouco depois de eu chegar,
chegaram a minha irmã, cunhado e duas colegas dela. Nossos olhares eram de curiosidade,
de receio, de expectativa pela novidade.
Confirmamos a inscrição e
procuramos um local para nos posicionarmos. Ficamos no gramado, em círculo,
sendo de um lado as mulheres e do outro lado os homens.
Ouvimos por mais ou menos 20
minutos algumas orientações do organizador que me tranquilizaram bastante, pois
até então eu estava com medo de passar mal na minha primeira experiência.
Fomos orientados a formar fila
para consumir o chá. Fui uma das últimas, tomei o equivalente a um copinho de
café.
O sabor não me foi desagradável. Parecia
um chá forte misturado com mel. Li alguns relatos em que sentiram sabor de terra,
gosto amargo e não percebi dessa maneira.
Retornei ao meu lugar onde havia
colocado o colchonete, sentei de pernas cruzadas, fechei os olhos e ouvia o início
do ritual. Foram colocadas umas músicas com sons de tambores indígenas, sinos,
e sentia o cheiro do incenso no ar.
Por mais ou menos meia hora
fiquei meditando normal, sem nenhuma sensação diferente, apenas prestando atenção
na minha respiração, divagando um pouco e ouvindo as músicas.
Foi quando começou a acontecer.
Pensei: ela chegou.
Uma sensação de frio interior
intensa me invadiu. Não era um frio exterior que sentimos na pele, era lá no
profundo do meu ser. Sentia que meus órgãos vitais estavam congelados. Coração,
pulmão, fígado, rins, tudo congelado. Concentrei-me na respiração e era como se
ela fosse fugindo, ficando cada vez mais imperceptível.
Meu corpo paralisou, eu poderia
ficar naquela posição por horas sem sentir qualquer incômodo. Eu dizia para mim
mesma que se eu quisesse me mexer eu me mexeria, mas que aquilo era tão diferente
que eu não iria sair dali e cortar o barato.
Puxei a respiração com força para
ter certeza que eu estava respirando. Ufa, estava. Era só deixar rolar.
Minha mente que sempre é povoada por
muitos pensamentos ficou silenciosa, surgiu uma tela totalmente preta que eu
olhava e perguntava para mim mesma: o que vai surgir nessa tela? E aguardava e
não vinha nada.
O que eu preciso saber? O que me
trouxe aqui? E nada.
Meu cunhado começou a sentir mal,
ouvi que ele veio até a minha irmã e falou que estava com o coração acelerado,
eu não consegui abrir os olhos.
A música ecoava na minha mente
como se estivesse acontecendo dentro do meu cérebro, eu ouvia com aquele efeito
“surround”, um barulho de sino tocava bem do lado da minha orelha direita,
depois um som de tambor ou chocalho que eu ouvia com muita nitidez na parte
posterior da cabeça.
Começaram a surgir as imagens. Parecia
um labirinto de massinha colorida que ia se juntando, depois algumas flechas
vindas em minha direção que eu observava sem sentir medo. Uma sucessão de
imagens rápidas, muito coloridas, cores intensas e vibrantes que pareciam o
cenário do filme Avatar.
Vi uma bola grande de sangue
explodir bem no meio da minha testa.
Em alguns momentos abri os olhos
para olhar como estava minha irmã, ela parecia estar bem na primeira parte,
olhava em direção ao meu cunhado, vi ele levantar algumas vezes, depois ficou
deitado e parecia tudo sob controle e eu voltava a fechar os olhos.
Uma parede começou a despedaçar em
câmera lenta, os pedaços iam se espalhando pelo ar enquanto eu observava.
Eu abria os olhos e percebi que
podia “voltar” quando quisesse. A sensação física era de um peso imenso no meu
corpo, eu poderia me mover se quisesse, mas a sensação mental de peso era tanta
que eu nem tentava. Só mexia as mãos para ter certeza que não era uma pedra.
A sensação nesse momento era que
eu tinha me tornado uma rocha, estática, fria, e tudo acontecia na região da
minha testa, tudo o que eu via e percebia era ali e mais nada de mim existia.
Fechei os olhos e deixei me
levar.
Comecei a refletir sobre alguns
aspectos da minha vida, relembrei minha mãe já falecida e tive um diálogo não diretamente
com ela, mas com a memória dela. Nesse instante lágrimas desciam pelo meu rosto.
Perdoei e pedi perdão a ela, ao meu pai. Agradeci, perdoei e pedi perdão a
todos que vieram antes de mim.
Vez ou outra tentava recobrar a consciência
e abria novamente os olhos, via a fisionomia das pessoas, cada um vivendo ali
sua experiencia de maneira única. Tive vontade de dar risada, mas fechei os
olhos para me conter.
Quando abria os olhos eu retomava
contato com a realidade, mas era só fechá-los que voltava a tela preta e suas
imagens ou meu diálogo interno em relação a algum aspecto da minha vida.
Recebi do meu próprio inconsciente
algumas instruções de melhorar em alguns aspectos (não vou descrever aqui por serem
pessoais) mas eram bem claras: você tem que fazer isso... tal pessoa é assim e assim... As instruções eram
boas e positivas.
Na segunda parte eu preferi não tomar
outra dose. Ainda estava meio “grogue” e voltando à consciência. Eu queria que
a sensação de peso passasse para eu voltar para casa.
Foi algo diferente de tudo o que
eu já vivi. A gente fica a sós com a própria consciência de uma maneira muito
intensa. Vê muitas formas, cores, ouvi sons de uma maneira incrível.
Eu não sei em que estado de
espírito é bom que se esteja quando se deseja tomar a ayahuasca... o meu estava
tranquilo, só estava receosa sobre o que poderia acontecer.
Sobrevivi.
Eu não tinha virado uma pedra,
que alívio. Aos poucos fui saindo daquele estado letárgico e minha capacidade motora,
cognitiva e tudo o mais tinham se reestalecido, eu estava de volta a mim,
estava bem.
Foi tudo uma grande viagem em 4D.
Quem deseja ir, recomendo que se instrua
bastante a respeito e a bebida do cipó te leva onde ninguém nunca esteve, então
todo cuidado é pouco.
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